Não sei ao certo quando isso começou, mas já virou hábito discutirmos sobre
o desempenho geral do grupo depois de cada apresentação. Era comum classificarmos
um dia de espetáculo como sendo “bom” ou “ruim” tendo como parâmetro obviedades
raramente atendidas: escuta , generosidade e atenção em cena. É claro que, se
tratando de uma improvisação, entradas coerentes e criatividade são
indispensáveis para a realização de um jogo bem-sucedido. Entretanto, há uma
outra característica relevante no Melodrama
da meia-noite, que além de constituir o seu diferencial, também se mostra decisiva
na estética de representação adotada: a participação do espectador, mais
precisamente o Povo de Paris .
Todas as experiências anteriores tinham se
dado unicamente no ambiente acadêmico, e quando surgiu a proposta de nos apresentarmos
fora dos portões da UNIRIO, foi visível a
motivação causada pela oportunidade, mas ao mesmo tempo surgiram dúvidas quanto
à maneira de conduzir o jogo do Gaulier. Afinal, não estaríamos mais diante de
familiares, amigos e estudantes universitários de teatro...
Não é com exagero que afirmo que aquele 5 de maio foi de fato um divisor
de águas. A plateia formada por desconhecidos,
em sua maioria adolescentes, constituiu o melhor Povo de Paris que tivemos, já que além da manifestação previsível
do riso, também surgiram momentos surpreendentes de comoção. As
interferências abrangiam uma sucessão de pedidos que não apenas estimulavam tentativas
originais de criação, mas quase
determinavam o desenrolar da cena.
As habituais moedas foram substituídas
por balas que direcionadas ao tablado toda a vez que se estabeleciam
identificações com a telenovela e com demais elementos encontrados no universo midiático.
Solicitações direcionadas diretamente
tanto ao Monsieur quanto aos atores se fizeram presentes a todo instante,
resultando em uma relação palco–plateia despretensiosamente leve e divertida .
A impressão que se tinha era que aqueles jovens
eram tão jogadores como nós.
Naquele sábado , o melodrama ocorria
debaixo de um sol de meio-dia, sendo assistido por olhares desafiantes, mas
não resistentes.
Novidade para eles, incentivo para
nós.
Helena Hamam
atriz da Cia. Melodramática do Rio de Janeiro
fotos: Profa. Marina Henriques
ONG Redes da Maré - www.redesdamare.org.br
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